Encontro com a história
Chegar de férias, já de madrugada, acordar cedo, vestir roupa mais formal, mais urbana e arrancar com a família para Coimbra.
Centenário do nascimento de Miguel Torga, hoje 12 de Agosto. Para assinalar a data, a Câmara Municipal de Coimbra encomendou uma obra a dois consagrados escultores, um deles o ex-Reporter Estrábico, António Olaio.
Chegámos em cima da hora, com o atraso característico - 15 minutos - o suficiente para ouvir as últimas palavras de
Manuel Alegre. De seguida, ouvimos Carlos Encarnação, presidente da CMC e claro, passado uns 5 minutos podemos contemplar a interpretação da vida e obra literária de Miguel Torga, pelos referidos escultores.
Uma perpendicular ao rio na direcção do edifício no Largo da Portagem, onde o médico teve o seu consultório, para criar um passadiço em xisto, iniciando o Memorial Miguel Torga. As grades de segurança sobre o Mondego, foram cravadas com um curto poema sobre as águas serenas do Rio e sob este 5 letras, T O R G A. Um trabalho simples, sem bustos de escritores ao frio, ao vento e sujeitos aos dejectos dos pássaros.
Às 12h no Espaço Chiado, visitámos uma exposição retrospectiva sobre a vida e obra de Torga. Os livros, os dados biográficos, as referências de vários jornais, a nomeação para o Nobel de 1960 e claro, os dados da PIDE. O retrato do escritor, do médico, pela polícia política. A sua prisão em 1940 e a sua libertação, passado uns tempos. A sua vida policiada.
Já em época de liberdade, a relação, embora divergente, cordial com Mário Soares.
Um homem não compreendido no seu tempo, por escrever sobre o mundo rural, em ambientes urbanos. Se foi assim em vida, hoje será mais difícil interpretá-lo.
E que dizer destas palavras de Eduardo Lourenço: "Lembro-me de o Torga me ter contado uma história que se passou com um ministro de Salazar, o Leite Pinto, que ia ao Brasil. O Torga tinha estado lá e era muito conhecido no Brasil, de modo que podia servir como uma espécie de cartão-de-visita, mesmo sendo hostilizado cá dentro. Ora, esse Leite Pinto, antes de partir, foi-se despedir de Salazar e, nessa visita, começou a recitar um poema do Torga. O mais interessante é que Salazar continuou o poema, e acabou de o dizer.
O Torga contou-me isto com lágrimas nos olhos. A vida é muito complicada"?
Ambiguidades históricas!